O adicional de periculosidade ao trabalhador que utiliza a motocicleta como ferramenta de sua atividade laboral, tratou-se de uma inovação trazida ao nosso ordenamento jurídico através da Lei nº 12.997 de 2014, a qual alterou a redação do artigo 193 da CLT.
Nesse sentido, enuncia o art. 193, §4º, da CLT:
Art. 193. São consideradas atividades ou operações perigosas, na forma da regulamentação aprovada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, aquelas que, por sua natureza ou métodos de trabalho, impliquem risco acentuado em virtude de exposição permanente do trabalhador a:(Redação dada pela Lei nº 12.740, de 2012)
§ 4º São também consideradas perigosas as atividades de trabalhador em motocicleta. (Incluído pela Lei nº 12.997, de 2014)
Ocorre que é patente a ausência de eficácia do § 4º do art. 193 da CLT, citado acima, haja vista que carente de regulamentação conforme o quanto determina o artigo 196 da CLT.
Observe-se que, o até então, o Ministério do Trabalho e Emprego estava autorizado pelo art. 200 da CLT, a editar normas que envolvam atividades insalubre e em condições de que exijam conhecimentos técnicos especializados, impondo condição de ser assegurada a participação de todos os interessados.
A Lei n. 12.997/14, que acresceu o § 4º ao artigo 193 da CLT, estabeleceu que as atividades exercidas por trabalhadores que utilizam motocicleta são consideradas perigosas, fazendo jus ao adicional de periculosidade a partir da sua regulamentação.
O Ministério do Trabalho publicou a Portaria MTE 1.565 /2014, aprovando o anexo V da NR 16.
Esta portaria veio regulamentar a alteração feita pela Lei 12.997/2014, publicada em 20/06/2014, alterando o artigo 193 da CLT, o qual incluiu o § 4º no referido artigo, atribuindo aos motociclistas o direito ao adicional de periculosidade de 30%. Só a partir daí houve regulamentação ínsita ao deferimento do adicional, já que a lei acima trouxe norma um tanto quanto abrangente e que dependia de regulamentação.
Tanto é necessária tal regulamentação que o art. 196 da CLT traz o seguinte requisito:
“Art. 196- Os efeitos pecuniários decorrentes do trabalho em condições de insalubridade ou periculosidade serão devidos a contar da data da inclusão da respectiva atividade nos quadros aprovados pelo Ministro do Trabalho, respeitadas as normas do artigo 11.”
Desde então, em razão de inúmeros processos judiciais questionando a regulamentação, várias portarias foram publicadas pelo antigo MTE, ora suspendendo de forma integral a aplicação da Portaria 1.565/2014 (publicada em 14/10/2014), ora suspendendo a aplicação apenas para algumas empresas e associações, sem revalidar, em momento algum a portaria acima citada.
Entretanto, como já foi dito, posteriormente, essa Portaria acabou por ter seus efeitos suspensos por meio de diversas outras decisões pelo que passamos a demonstrar o histórico de revogações:
Portaria TEM 1152/2015
Suspende os efeitos da Portaria MTE nº 1.565 de 13 de outubro de 2014 em relação às empresas associadas ao SINDICATO NACIONAL DAS EMPRESAS DE LIMPEZA URBANA – SELURB e SINDICATO DAS EMPRESAS DE LIMPEZA URBANA NO ESTADO DE SÃO PAULO em razão do deferimento do pedido de antecipação de tutela concedido no âmbito do processo nº 11441-70.2015.4.01.3400, que tramita na Seção Judiciária do Distrito Federal – Tribunal Regional Federal da Primeira Região.
Portaria MTE 1.930/2014:
Suspende integralmente os efeitos da Portaria MTE 1.565/2014;
Portaria MTE 5/2015:
Revoga integralmente a Portaria MTE 1.930/2014 e ainda suspende os efeitos da Portaria MTE 1.565/2014 em relação aos associados da Associação Brasileira das Indústrias de Refrigerantes e de Bebidas não Alcoólicas (ABIR) e aos confederados da Confederação Nacional das Revendas AMBEV e das Empresas de Logística da Distribuição;
Portaria MTE 220/2015:
Suspende os efeitos da Portaria MTE 1.565/2014, em relação às empresas associadas à AFREBRAS, em razão de antecipação de tutela concedida nos autos do processo nº 5002006-67.2015.404.7000, que tramita na 1ª Vara Federal de Curitiba/PR. Também suspende os efeitos da Portaria MTE 1.565/2014, em relação às empresas associadas às associações e sindicatos, com relação de empresas abrangidas, em razão de antecipação de tutela concedida nos autos do processo nº 89075-79.2014.4.01.3400, que tramita na 14ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal;
Portaria MTE 506/2015:
Suspende os efeitos da Portaria MTE 1.565/2014 em relação às empresas associadas à ABEPREST, em razão do processo nº 0007506- 22.2015.4.01.3400, que tramita na 2ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal;
Portaria MTE 946/2015:
Suspende os efeitos da Portaria MTE nº 1.565, de 13 de outubro de 2014, em relação às empresas associadas à ABESE, em razão de liminar concedida no âmbito do processo 31822-02.2015.4.01.3400, que tramita na 2ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal;
Portaria MTE 137/2017:
Suspende os efeitos da Portaria MTE nº 1.565, de 13 de outubro de 2014, em relação às empresas associadas à Associação dos Distribuidores de Produtos Schincariol do Centro Oeste e Tocantins – ADISCOT em razão da liminar concedida no âmbito do processo 0026220-30.2015.4.01.3400, que tramita na 16ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal;
Portaria MTE 440/2018:
Suspende os efeitos da Portaria MTE 1.565/2014, em relação ao COMPANHIA ENERGÉTICA DO MARANHÃO – CEMAR e OUTROS, em razão do provimento do agravo de instrumento no âmbito do processo 0067966- 87.2015.4.01.0000, pelo Tribunal Regional Federal da Primeira Região;
Portaria MTB 458/2018:
Anula a Portaria MTE 506/2015, que suspendeu os efeitos da Portaria MTE 1.565/2014 em relação às empresas associadas à ABEPREST.
Ora, ficou clara a insegurança jurídica e a falta de normativo regulamentar para o deferimento de adicional de periculosidade sobre tal circunstância.
A CLT, em seu art. 196, como citado anteriormente, é clara ao dizer que os efeitos pecuniários do adicional de insalubridade e periculosidade só são devidos com a inclusão da atividade nos quadros aprovados pelo antigo MTE, o que não vem acontecendo atualmente.
Vale frisar ainda que em 17/10/2016 foi proferida decisão de mérito na ação 11441-70.2015.4.01.3400 (cujo autor foi o SINDICATO DAS EMPRESAS DE LIMPEZA URBANA NO ESTADO DE SÃO PAULO), que tramitou na 6ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal, quando se acolheu o pedido de anulação da Portaria nº 1.565 do ex-MTE, por vícios formais na condução de seu processo de regulamentação.
Sendo assim, diante da irregularidade da Portaria que garantia aos motociclistas o adicional de periculosidade, não há que falar em norma atual que defira tal tipo de pretensão.
O fato de a Portaria 1.930/2014 ter sido revogada pela Portaria 05/2015 não fez ressurgir ao mundo jurídico a Portaria 1.565/2014 já revogada, em decorrência da inexistência de repristinação (instituto jurídico que ocorre quando uma lei revogada volta a vigorar após a lei que a revogou perder sua validade) no nosso ordenamento jurídico.
A Portaria nº 1.565 do ex-MTE, de 13/10/2014, que garantia o direito dos motociclistas ou motoboys ao adicional de periculosidade, foi, também, anulada de forma definitiva em outubro de 2016 e dezembro de 2016, em julgamento proferido na 20ª Vara Federal do Distrito Federal através dos processos nº 0078075-82.2014.4.01.3400, do processo nº 0089404-91.2014.4.01.3400 e da 6ª vara FEDERAL no processo nº 11441-70.2015.4.01.3400 (este último, cujo autor foi o SINDICATO DAS EMPRESAS DE LIMPEZA URBANA NO ESTADO DE SÃO PAULO)
Resumindo: o artigo 193, parágrafo 4º, da CLT expandiu o rol das atividades consideradas de risco, dispondo que “São também consideradas perigosas as atividades de trabalhador em motocicleta”. Essa norma foi regulamentada pela Portaria n 1.565, de 13 de outubro de 2014, que aprovou o Anexo 5 da NR-16, assegurando o direito ao adicional de periculosidade a todos aqueles que utilizam a motocicleta em suas atividades profissionais, deslocando-se em vias públicas, com exclusão apenas do percurso entre a residência e o trabalho. Entretanto, tal portaria foi considerada nula, de modo que não há como se aplicar o quanto disposto no referido artigo por falta de regulamentação.
E este é o entendimento dos Tribunais, vejamos:
ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. MOTOBOY. PORTARIA 1565/2014 DO MTE. A Lei n. 12.997/14, que acresceu o § 4º ao artigo 193 da CLT, estabeleceu que as atividades exercidas por trabalhadores utilizando motocicletas são consideradas perigosas, fazendo jus quem as exerce ao adicional correspondente a partir da sua regulamentação. Embora a regulamentação pelo MTE tenha ocorrido em 14.10.2014, por meio da Portaria 1.565, teve os seus efeitos suspensos, conforme reconheceu o Ministério do Trabalho e Emprego através das Portarias nº 1930/2014 e 05/2015. Portanto, a Portaria 1565/2014 não pode mais produzir efeitos, sendo indevido o adicional o reclamante, eis que a Lei 12.977/2014 não tem aplicação imediata. (Processo 0001048-87.2017.5.05.0016, Origem PJE, Relator(a) Desembargador(a) VANIA JACIRA TANAJURA CHAVES, Terceira Turma, DJ 12/12/2019)
ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. MOTOBOY. ARTIGO 193, § 4º, DA CLT. PORTARIA 1.565/2014. NULIDADE DECLARADA POR DECISÃO DA JUSTIÇA FEDERAL. O artigo 193, § 4º, da CLT, com a redação dada pela Lei nº 12.997, de 20/6/2014, dispõe que: “São consideradas atividades ou operações perigosas, na forma da regulamentação aprovada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, aquelas que, por sua natureza ou métodos de trabalho, impliquem risco acentuado em virtude de exposição permanente do trabalhador a: (…) § 4o São também consideradas perigosas as atividades de trabalhador em motocicleta.” Contudo, não é devido o pagamento do adicional de periculosidade ao reclamante, tendo em vista que a Portaria 1.565/2014 do MTE, que regulamentava a matéria, foi declarada nula por decisão da Justiça Federal. (TRT-3 – RO: 00106701720215030014 MG 0010670-17.2021.5.03.0014, Relator: Rodrigo Ribeiro Bueno, Data de Julgamento: 06/04/2022, Nona Turma, Data de Publicação: 07/04/2022.)
“RECURSO DE REVISTA. APELO INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI N.º 13.105/2015 (NOVO CPC). ADICIONAL DE ATIVIDADE. MOTOCICLISTA. LEI N.º 12.997/2014. ART. 193, § 4.º, DA CLT. VIGÊNCIA A PARTIR DA REGULAMENTAÇÃO PELO MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO. Cinge-se a controvérsia a saber se os termos do caput do artigo 896 da CLT são autoaplicáveis aos trabalhadores que exercem atividades como a de motociclista, ou seja, se o disposto no § 4.º do art. 193 da CLT se aplica a partir do dia 20/6/2014, data de publicação da Lei n.º 12.997/2014, que o instituiu no mundo jurídico, ou da regulamentação dessa norma pela Portaria MTE n.º 1.565/2014. Na diretriz do caput do artigo 193 da CLT, “são consideradas atividades ou operações perigosas, na forma da regulamentação aprovada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, aquelas que, por sua natureza ou métodos de trabalho, impliquem risco acentuado em virtude de exposição permanente do trabalhador a […]”. Ademais, na forma do § 4.º desse dispositivo da CLT, “são também consideradas perigosas as atividades de trabalhador em motocicleta”. Como se vê, consta expressamente na indigitada norma que as atividades de trabalhador em motocicleta são consideradas perigosas, “na forma da regulamentação aprovada pelo Ministério do Trabalho e Emprego”, não havendo de se falar na aplicabilidade imediata da norma. Desse modo, o referido benefício não é autoaplicável, pois carece da regulamentação do órgão competente. Verifica-se, assim, que o deferimento do adicional de periculosidade no período não regulamentado pelo Ministério do Trabalho e Emprego, na forma preconizada no artigo 193 da CLT, fere o próprio espírito da referida norma. Recurso de Revista conhecido e provido. (RR- 11011-21.2015.5.15.0046, Rel. Min. Maria de Assis Calsing, 4ª Turma, DEJT 19/12/2016)
Assim, verifica-se que todas as sentenças de mérito citadas acima declararam a nulidade da portaria 1.565/2014 de forma geral, não declarando sua nulidade em relação somente ao sindicato autor das ações.
E não se fala aqui das decisões de antecipação dos efeitos da tutela, mas de decisões transitadas em julgado que declararam nula a portaria de uma forma geral.
Desta forma, tem-se que todo juízo tem por obrigação, para uma correta e válida entrega da prestação jurisdicional, verificar a validade, a vigência e a eficácia da norma antes de proferir a sentença, situação que tem que ser observada de ofício pelo juízo.
Desse modo, considerando que não há fundo normativo, ou seja, diante da necessária regulamentação para o deferimento de adicional de periculosidade para motociclistas, temos a invalidade da norma que instituiu referido adicional.
Assim sendo, se faz necessário que seja editada nova portaria pelo MTE regulamentando o direito ao adicional de periculosidade para motociclistas, atribuindo validade ao art. 193, § 4º da CLT, por força do art. 196 também da CLT.
O Escritório de Advocacia Turiano, Nunes e Bonelli Advogados vem conseguindo diversas decisões favoráveis acerca do tema, a exemplo dos processos: 1000258-21.2023.5.02.0611, 10006311920205020074.